domingo, 28 de fevereiro de 2010

Caixinha de Problemas

Em uma busca costumeira no fim de domingo, reencontrei uns velhos rascunhos de meu bebê pergaminho, datando do início da história. Reli todos eles, pensando em como era bom deixar os dedos correrem pelas teclas à toa, sem nenhum limite restrito de tempo e nenhuma censura que me impedisse de narrar o cotidiano de meus personagens. Pensando vez ou outra quando esbarrava nas falas "Caramba, eu escrevi mesmo isso?", ou "Nota T de Trasgo para este aqui." Um bom domingo.
Talvez esteja mais do que na hora de apresentar meu querido clã no empório. Não está aquela maravilha, coisa que qualquer rascunho não é, mas serve como ponto de partida. Uma boa introdução de maneiras esquisitas e encantadoras desses seres inventivos que existem para mim. Um diário dos Baudelaire.
Antes de mais nada, um PRÉ-script lembrando que a cidade natal da saga localiza-se em Derwentside, no Condado de Durhan. Qualquer modificação em posts anteriores é de total responsabilidade da autora aqui, de modo que seguirei relatando mais trechos do diário sempre que possível, bem como capítulos velhos e novos. Que sirva de aviso. (:
Postei um breve capítulo narrando Bernard há alguns dias atrás. Aqui o cap segue, junto de uma parte do rascunho que oficialmente apresenta meus vampiros.
Boa leitura!

1º Parte - O encontro

"A manhã permanecia acinzentada, com poucos focos de luz por entre as nuvens espessas, irradiando um alaranjado desbotado sobre as árvores e telhados, refletindo no ladrilho das ruas. Por elas eu andava em direção à estação de metrô mais próxima. Outro padrão a ser seguido metodicamente. Eu já não me preocupava em observar os movimentos das pessoas que seguiam pelo mesmo caminho, coisa que eu fizera infinitesimalmente na primeira semana. Eu costumava ficar sentado em um banco perto da fonte, ou em Elizabeth Carrow State Park, meio escondido entre as figueiras, fitando os ternos de risca de giz em homens sérios demais para se supor que faziam algo satisfatório, e os vestidos de lã escura em damas com aparência arrogante demais para se dizer que eram simpáticas.
Eu ficava fascinado. Com o passar do tempo, a nostalgia e o mesmo tipo de medo de ser o desconhecido começava a predominar em minhas feições quando eu saía na rua. A auto-estima era algo que precisava ser polido antes de ser conquistado.
A estação estava cheia àquela altura; executivos, bancários e universitários lotavam o piso de pedra que separava os trilhos da bancada central. Dirigi-me em direção aos bancos localizados após a entrada em formato de arco, aproveitando para escorar a cabeça na parede de tijolos atrás de mim e fechar os olhos mais um pouco, insensíveis a essa altura devido a tamanho cansaço. Deixei minha mente vagar por trabalhos feitos em cima da hora – um com o tema livre no qual eu desenhara um labirinto muito parecido com as ruas estreitas no final da avenida, por onde eu me perdera certa vez – provas remarcadas e ao provável período em que teria de enfrentar o mau-humor do professor de teorias.
Em pouco tempo o barulho nos trilhos me arrancou do estupor e eu já estava sentado nos últimos bancos do vagão. Um homem magricela que também usava terno, mas o escondia por uma longa capa de veludo negro me observou do alto com olhos semicerrados por alguns segundos, acabando por sentar-se na mesma fileira. Ignorei-o como fazia com todo mundo, vagando outros tantos minutos até a chegada na universidade.
Claire Norms University possuía um total assombroso de 40 mil alunos. Localizada na parte central de Derwentside, era ladeada por muros austeros que escondiam a verdadeira identidade da estrutura incrivelmente imensa. As árvores gigantes circundavam a parede que não permitia qualquer visão do espaço interior a alguém que cruzasse pelo lado de fora. A universidade se parecia muito com aqueles castelos góticos dos séculos passados, o que não me surpreendia, estando naquele lugar... E era a mais prestigiada da região, o que pouco me interessava. Atravessei os portões de ferro e alcancei o patamar das escadarias em direção ao grande saguão.
O transtorno matinal não estava tão tangível naquela segunda, pois todos por quem eu passava conservavam expressões sonolentas e apaziguadoras, um pouco rabugentas também. Como se ninguém tivesse muito assunto para por em pauta. Prossegui em direção às escadas circulares no corredor serpenteado, trancando meus bocejos dentro da boca e vasculhando minha pasta à procura do último trabalho. Perdi a conta de quantos bocejos tranquei e alguns deixei escapar, e de quantos degraus subi, mas o barulho era mais proeminente no terceiro andar.
O maldito papel não estava em lugar algum. Vasculhei mais atentamente a bagunça de minha mochila, arredando papéis para os cantos, afastando com um safanão os pacotinhos de jujuba perdidos e roçando o marcador de Hamlet, tudo isso conforme eu continuava me movendo à última sala. Então, sem aviso, com um baque que quase me derrubou no chão, bati de encontro a um estudante parado no meio do corredor.
Ergui a cabeça, pronto para reclamar de sua postura idiota, quando reconheci a veterana das aulas de Arte. Seu rosto inexpressivo me tirou o fôlego. Era algo do qual eu não estava acostumado a sentir. Mas era absolutamente impossível não sentir nada quando uma jovem que parecia feita de porcelana, tamanha brancura de sua pele, em contraste com cabelos flamejantes de mogno espelhando os olhos negros feito carvão e reluzindo nos lábios comprimidos e avermelhados te encarava.
Minha respiração pareceu congelar na garganta. Não somente por sua beleza absurda, mas pelo contato proeminente com o frio que senti emanar de sua pele; como se eu estivesse congelando junto de minha respiração. Sentia-me estranho enquanto não despregava o olhar de seu rosto, procurando inutilmente um pedido de desculpas que me libertasse da obstrução.
– Eu... me... desculpe – gaguejei inutilmente diante dela. O frio aumentava.
A jovem branca também não desviava o olhar. Era ridícula a suposição de que ela também se sentia aparvalhada como eu. Não tive chance de examinar melhor sua expressão, quando parecia que seus olhos me puxavam para aquele negrume sem saída. Eu queria poder soltar a língua e pedir que fosse embora. Ou, se a educação ainda estivesse presente nos meus genes, pedir licença para me afastar do buraco negro.
– Cecily? – chamou uma voz delicada de sino, muito distante.
A jovem demorou-se em seu fulgor nos meus olhos por um segundo, depois virou a cabeça para a voz. Eu, meio amortalhado, segui o movimento, deparando com outra jovem tão branca quanto. Deveriam ser irmãs, supus, ainda sentindo o oco reverberando em minha boca.
– Bom dia, cavalheiro – cumprimentou ela, relanceando os olhos intensamente verdes em minha direção. Seus cachos escuros contribuíam para a mesma beleza surreal que eu presenciava no caos do corredor. Era tão baixinha que por um momento repensei a idéia do parentesco.
Mas quem poderia ser igualmente lindo?
Que maneira mais estranha de cumprimentar alguém, pensei, atribuindo um mero aceno de cabeça em troca.
– Vamos – insistiu a outra, retirando a mão do bolso do casaco sobre o vestido de lã. Suas vestes pretas eram semelhantes, percebi quando enfim consegui examiná-la melhor sem me assustar.
Enquanto a pequena puxava sua mão, seus olhos voltaram aos meus com uma rapidez desconcertante. Eu fiquei paralisado no lugar até perdê-las de vista. Depois, muito lentamente, em meio a um tremor de frio que não tinha nada a ver com a brisa que entrava pela janela de vitral entreaberta, encontrei minha imagem no reflexo do vidro. O azul profundo de meus olhos estava totalmente elétrico."

2ºParte - Na mesa dos Baudelaire

"– Você poderia pensar duas vezes antes de cumprimentar alguém que não tenha cem anos.
– Não fiz nada desapropriado. Não considero errado cumprimentar quem quer que seja com educação, Davi.
Voltei meus olhos resignados para o prato intocado no intervalo do almoço. Os murmúrios do refeitório me atingiam com a intensidade de gritos em minha cabeça, algo que não era controlável nem estimulado por minha audição apurada. Era somente uma das várias formas de tentar compreender o que se passava através da cabeça de todos eles.
E isso era algo que eu não me disporia a fazer.
– Cecily se perdeu pela manhã – comentou a menina, escondendo um riso por entre os punhos.
Fingi não prestar atenção no comentário que acabara de ouvir e no breve rugido que se seguiu. Para alguém como Ava Elizabeth, a empolgação deveria ter um nível explícito e limitado. Mas é claro que ela não checava as regras como eu. Relanceei um olhar para a pequena, vendo que ela continuava a conter o riso como aquela criança recordando algo extremamente cômico. A curiosidade me dizia que eu perdera alguma coisa.
– Qual o motivo para o riso? – perguntei disciplinadamente, uma vez que não queria deixar transparecer minha dúvida.
Nenhuma das duas respondeu. Discretamente, voltei os olhos para a jovem sentada ao extremo da mesa, a dona do rugido. Cecily conservava a expressão séria e amarga de todos os dias, como que depreciando as próprias injúrias da vida. Seus olhos eram escuros demais na pele nevoenta em um contraste chocante com as vestes escuras.
Ela não arriscaria encontrar meu olhar. Não se quisesse partilhar seu mais novo segredo. O que era pouco provável vindo de alguém que abrigava somente a sombra na falta freqüente de voz.
– Justamente o que nos levou ao corredor onde minhas maneiras comportadas escaparam – respondeu Ava, a expressão inocente.
Franzi o cenho. Se o motivo da piada interna estivesse relacionado com algum veterano que sequer desconfiava de nossa aberração...
– Vocês não têm noção do perigo – falei entre dentes, encarando uma maçã e esperando que por ela se abrisse um furo devido à minha fúria repentina.
Uma fragrância almiscarada me cercou, diminuindo meus temores e dissipando minha irritação de modo muito suspeito para um ambiente abafado como o refeitório.
Olhei feio para Ava.
– Relaxe – murmurou ela, observando o pandemônio do lugar com olhos amplos, antes de voltar a se concentrar em seus beagles em formato de uma cabana abandonada. Ela adorava fazer artesanato com comida... A idéia me era repulsiva.
Um movimento rápido em minha visão periférica me fez voltar a atenção à Cecily. Seu corpo inteiro ficara rígido, suas mãos interromperam-se no coque dos longos cabelos flamejantes e seus olhos negros brilhavam em chamas.
Senti minhas entranhas ressuscitarem. Eu já vira aquele olhar.
Ava virou-se de imediato na direção da entrada e eu a acompanhei, mas não deduzi o que poderia ter de diferente ali para deixar Cecily alarmada. Fitei as mesas dispersas, tentando bloquear os assuntos que me encontravam no trajeto, cada qual ameaçando implodir minha concentração, deparando por fim com um casal adentrando as portas de corrida para o pátio interno.
Eles passaram por nossa mesa antes de desaparecerem. Não demonstravam ser realmente um casal; o jovem alto mantinha as mãos nos bolsos do casaco enquanto a pequena de vestido cinza trazia um livro em mãos, sua cabeça voltada na direção das palavras dele que pareciam ter certa dificuldade para sair.
Um comportamento de amigos. Então por que Cecily os encarava como se visse um inimigo?
Novamente a fragrância distinta enovelou meus pensamentos. Cecily escorou-se na cadeira, os olhos duros mirando o vazio. Sua respiração era difusa.
Uma palpitação em meu estômago me alertou do perigo iminente, se é que eu poderia chamar o cômodo oco dentro de mim de palpitação. Inclinei-me por sobre a mesa e esperei que ela voltasse ao normal, para que assim eu pudesse encontrar os seus olhos e descobrir o que a afligia agora.
Seria mesmo muito difícil ter um dia normal?
A resposta era muito óbvia. Alguém anormal não merecia a normalidade. Devia ser por isso que o desastre sempre ficava à espreita com um sorrisinho maldoso, esperando a oportunidade certa para acontecer.
Neste caso, o nome do recente desastre era Cecily Dominic Baudelaire.
Não chegou a durar um segundo. Ela uniu as extremidades do vestido preto em suas mãos e saiu de seu lugar, ignorando a bandeja intocada e os grampos de cabelo que jaziam ao lado. Seus passos não provocavam o menor ruído em meio às conversas, mas sua caminhada – descuidadamente apressada, como um vulto fugindo da luz – atraiu a atenção da maioria dos estudantes que aproveitavam os minutos normais de intervalo.
Pude sentir meus olhos faiscando enquanto se voltavam para o rosto de Ava.
Ela ainda mirava a porta de corrida como se tivesse acabado de ver uma pomba refletida na quietude do pátio nublado.
– Temos um problema – murmurou. O rosto de neve destacava de modo muito sutil a preocupação pela garota subitamente desvairada.
Eu queria enfiar aqueles grampos em minhas pupilas e parar de tentar descobrir por meu próprio meio o que diabos estava acontecendo.
– Ava – minha voz era uma súplica. Ela sabia o quanto me afligia ficar de fora enquanto o desastre subia no palco e encenava o que de pior já era presente em nossa rotina.
Ela soltou um suspiro e refletiu por meio segundo, imersa em pensamentos, quando seus densos olhos – verdes como florestas serpentinas – encontraram os meus.
E assim eu entendi. O amplo espelho de jade me abriu um mundo de terror e fantasia conforme eu captava vislumbres de épocas passadas, viajando em questão de segundos no tempo real e enfim percebendo o que causara a ira de Cecily. Por entre um círculo de sombras na imagem enevoada em sua mente, visualizei o garoto alto em um dos corredores da Claire Norms, e o reconheci tão rapidamente quanto me desviei de seu olhar.
– Você entende agora? – perguntou Ava, a voz trazendo um leve tremor de medo.
Sim, eu entendia. Tanto que desejava nunca ter entendido. Tinha de admitir que meu dom servisse para alguma coisa além de detectar problemas, mas isso ameaçava ser um problema. E, obviamente, era Cecily quem sempre trazia uma caixa cheia deles.
Como se já não bastasse ser uma aberração e conviver com aberrações por tempo indeterminado. Eu poderia conviver com ela tantas outras vidas e não aprovaria seu modo de ver as coisas. Como se tudo fosse obrigado a girar em torno de seu umbigo e as conseqüências que esperassem, ou partissem, deixando-a com sua glória.
Outra coisa que me era repulsiva demais para que eu conseguisse ficar calado.
– Eu os conheço – murmurei, desviando meus pensamentos do luxo perverso de Cecily para me concentrar em sua provável vítima. – Fazia algum tempo que eu não os via... Ele é um veterano de desenho industrial e ela é a bibliotecária...
Um chiado foi só o que ouvi em resposta.
Assimilei os fatos em silêncio, esperando que alguma solução aparecesse do nada e abrisse os olhos infantis de Cecily. Ironia das grandes, uma vez que infantil não se compactava com sua real idade. Porém, com uma mente compulsiva e determinada como a dela, nada de bom se poderia esperar.
E era justamente o que eu evitaria que chegasse. O ente do meio da família Baudelaire ameaçava nos colocar em perigo se estivesse planejando alguma trama no palácio de seu cérebro. Mais uma. Se dependesse de mim, faria de tudo para impedi-la. Sonhos malucos em mundos aterrorizantes eram de se esperar, mas não poderiam ser concretizados ali, no condado de outono da qual agora nos instalávamos.
Seria um risco a mais que ninguém gostaria de presenciar. Definitivamente, nenhum humano estava pronto para tal risco.
A mão delicada e fria de Ava cobriu a minha em um gesto de consolo. Senti a textura macia junto ao perfume floral que me acalmava pouco a pouco, procurando ao menos esquecer por mais algum tempo aquela trama que tanto nos era familiar, mas que nos esgotava com a agilidade que a estação se movia em meio às árvores.
Árvores essas que se sobrepujavam ao olhar denso e verde de minha querida Ava. Desisti de meus devaneios e ergui a cabeça para admirar seu rosto de porcelana, emoldurado por aqueles cachos fartos de boneca.
– Teremos bastante tempo para discutirmos o assunto mais tarde – tranqüilizou-me ela, afagando minha palma.
– Sim – concordei amargamente. – Temos todo o tempo de que precisamos.
Os olhos da pequena vampira sorriram para mim."

E então?
Pensando (não pela primeira vez), que uma boa história necessita de algumas boas doses de terror e encantamento. Logicamente (pelo mesmo motivo), meus vampiros possuem alguns dons maléficos herdados daquele primeiro povoado que se instalou no decorrer da guerra civil, nas redondezas da cidadezinha - ler Ironias ao Acaso. Algo como características passadas de geração para geração, modificadas com o passar do tempo infinito. Agradeço nessas horas a disponibilidade com que minha mente caótica trabalha até quando estou dormindo, criando esses artefatos indispensáveis à história. Uma nota aceitável dessa vez.
Uma troca de olhares, um indício de perigo farejado no ar, uma caixinha de problemas... Assim a narrativa continua seguindo seu curso em um banco estofado de metrô. Minha consciência alerta outra forma de descanso nesse frio acolhedor de domingo. Dormir para que se possa sonhar.
P.S.: Um obrigado à trilha diversificada de hoje, AVA, Iron & Wine e, novamente, Muse. Arquitetos de linhas.


Boa noite! ^^

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Ironias ao Acaso


Notaram a cara nova (de novo) do meu cantinho? Muito mais atraente assim... ^^
Hoje voltei para casa - depois daquele lanche nada calórico (ironia) - ouvindo The Verve. Há quanto tempo Bittersweet Simphony não tocava no meu rádio... me fez clarear as ideias, repensar alguns fios sem lógica que não foram bem desenvolvidos. Minha noite superou minha tarde no curto passeio pela avenida pipocada de turistas insistentes. Me pergunto o motivo para os povos de fora em massa ainda não terem voltado para suas tocas... parece que a cidade encolhe à vista de tanta gente. Confere um brilho a mais na atmosfera branda do fim de verão.
Meu turno pelo Google Earth mudou minhas expectativas em um giro de 160 graus. Meu cenário épico de outono já não é mais o mesmo. Nada de grandes mudanças, apenas uns consertos aqui e ali. Não sou muito fã de mudanças abruptas... elas tiram a essência da questão. Modificam às apalpadelas aquilo que já havia sido registrado durante meses, ou anos. Mas às vezes é preciso seguí-las, adotá-las como um meio renovado de reescrita. E foi o que eu fiz. Mudei a localidade de todos os personagens com um simples clique no delete. Através desse novo endereço, compilei meu epílogo definitivo. A resenha que faltava para completar o roteiro do filme que passa seguidamente em minha cabeça.
Mas antes da narrativa, outra daquelas explicações obrigatórias para quem lê o que se é escrito nessa face de empório.
Aproveitei a deixa para criar um espaço com os títulos dos livros que já li e pretendo ler, ocasionalmente residindo na biblioteca da universidade local da saga, Claire Norms. Foi divertido editar partes de histórias que servem de inspiração, como aquele convite irrecusável ou aquele doce indispensável. O livro Café Resenha é da autoria de Jason Curtis Worden, o único filho de uma das famílias fundadoras do condado de Durhan, Inglaterra. Na época de sua juventude altamente provida de imaginações investigativas, seu passatempo era fuçar nos documentos de seu velho pai, enterrados sob a madeira oca do sótão. Diários relatando tempestades da guerra civil e, consequentemente, a chegada de povos nada comuns para as tradições locais do século XIX (o que ao pé da letra significa a chegada dos vampiros mais antigos da saga no condado pacato da velha Inglaterra). Anos mais tarde, quando tais vestígios preciosos das memórias foram esquecidos no mesmo sótão empoeirado, meu querido Jason tornou-se um famoso cineasta da Grande Londres, com o acréscimo da última herdeira dos Worden, sua filha Lauren. Os passatempos foram deixados de lado. Mas havia algo inquestionável para se cumprir.
Muito mais atraente assim (de novo). Aqui vai o epílogo...

"Condado de Durhan, 1987, Reino Unido. Residência dos Worden, sótão.

Anoitece. Na sincronia lenta e ritmada do vento, as copas das árvores curvam-se umas sobre as outras, como se cochichassem algum segredo diante da janela circular que range. Visão normalmente sinistra após a meia noite. As sombras resvalam em minha cama improvisada no sótão, onde seguidas vezes me embrulho em um grosso cobertor sobre tantos outros cobertores igualmente enxovalhados que formam um retângulo desproporcional ao tamanho de meu corpo.
Estamos na metade do outono, uma estação rigorosa para os europeus. E também cercada de mistérios. Circulam nas redondezas do distrito de Derwentside os mitos, de modo que os ouvintes nunca são capazes de desvendar a real intenção por trás dessas histórias narradas. Os habitantes sedentos por contos locais – como eu – fazem parte das diversas narrativas, acreditando realmente na credibilidade dos fatos, ocorridos há tanto tempo... Mas, como certa vez disseram os mais velhos, a sabedoria traz conseqüências irreversíveis, portanto muitos preferem somente sentar-se na roda e deixar os ouvidos vagarem para outros planos.
Obviamente, não sou como esses muitos.
Começaremos com uma apresentação. Sou o único filho da linhagem de uma das famílias mais renomadas de Durhan – de início um pequeno povoado com poucos moradores na área de baixa renda da Inglaterra, atualmente reconhecido como um apreciado monumento. Isso se deve em grande parte às construções vitorianas que se ultrapassaram o tempo, preservadas ao longo dos anos em um vasto cenário cinza, e aos atuais habitantes que pouco relatam suas histórias e muito comentam sobre os acontecimentos dos quais não lhe dizem respeito. Meu nome é Jason Curtis Worden, o rapaz incomunicável na maior parte do tempo que encontra a própria voz quando está sozinho, cercado de livros sobre histórias locais e desventuras familiares; heranças que nunca foram devidamente desbravadas. Bom, estou aqui para finalizar o serviço inacabado. Ou para recomeçá-lo, dependendo do ponto de vista.
É preciso deixar claro que este não é nenhum tipo de diário. Nada de documentos oficiais, segredos escondidos, confissões proibidas. Estas folhas não servem somente como um passatempo para alguém gravemente desprovido de sono em uma madrugada de domingo, mas também como uma prova de que se, algum dia outra pessoa pertencente à árvore genealógica dos Worden encontrá-las, saberá que essa história não foi passada em branco, como uma despedida breve após a guerra. Algumas décadas vividas, quando eu provavelmente estiver velho demais para me lembrar das mãos e dos olhos que acompanharam essa narrativa, passos pisarão nesse mesmo sótão que cheira a pinho, couro e páginas de livros. Outro par de mãos encontrará o vestígio de nossos antepassados e então o que restar do conto seguirá seu curso.
Os Worden complementam a origem dessa cidade tipicamente européia. Vista de fora, é comumente conhecida – e comentada pelos mesmos que preferem as histórias das quais não lhe dizem respeito – como uma família fora do padrão comum, se comparada com outras linhagens, o que aqui significa, no mínimo, o lar dos ingleses esquisitos. As marcas coloridas, camufladas no cinza. Por muito tempo fomos o ponto central dos burburinhos que circulavam pelas ruas, narrados como os entes desprovidos de riquezas, excluídos do patamar econômico, nível inferior na sociedade rigorosa daquela época. Eram tempos difíceis para os que aparentavam serem os menos influentes.
Haviam as contradições. Somente um verdadeiro Worden conhecia seus segredos nos padrões que deveriam ser seguidos. Uma família incomum que guardava em seu antro uma riqueza jamais vista ou compartilhada por outros nomes importantes na alta sociedade. A simples existência do segredo compelia nossos antepassados a ignorarem toda a discórdia e a rejeição do poder inquisidor europeu. Um verdadeiro Worden reconhecia seus princípios e lutava para defendê-los, não importavam os meios e extremos exigidos por tal causa. E, uma vez que cada membro da família se compelia em levar o segredo para o túmulo, qualquer ofensa ouvida era facilmente suportável.
Um legítimo Worden colocava-se sempre em perigo.
Como toda ação obtém uma reação, nosso caso não foi diferente. Descobri a resposta há algumas semanas atrás, em meio a uma faxina forçada nos aposentos da casa onde moro com meus pais. Uma simples organização nos documentos de meu pai revelaram a causa que mudara minha vida abruptamente, se não permanentemente. Diários guardados em gavetas embutidas e madeiras ocas, escritos por Timothy Neil Worden desde seus dezenove anos, minha idade exata. Verdadeiras relíquias que narravam as desventuras de um jovem em sua transição para adulto, sua passagem pelos tempos nublados de guerra. Seu ponto de vista sobre ambas as batalhas que deixariam conseqüências marcantes nos próximos anos. O relato completo da miscigenação que envolveria dois mundos completamente diferentes e ameaçadores um ao outro.
O mundo dos humanos, dos oprimidos durante o longo período torturante da guerra civil.
O mundo dos verdadeiros possuidores do trono, da supremacia que liderava os povos responsáveis pela exterminação quase completa dos habitantes da região.
A batalha interminável entre seres humanos e criaturas amaldiçoadas que durou meio século.
Ok. Sou apenas um humano, afinal de contas. Vítima de meu próprio entusiasmo. É difícil contê-lo em certos pontos da narrativa. No decorrer das próximas linhas, vou tentar ser objetivo, sem incluir observações fantasiosas que possam assustar as mentes mais fracas. Este é apenas o rascunho desenvolvido do que realmente aconteceu. Do que me foi relatado quando eu ainda usava fraldas e tinha medo de adormecer sozinho. O motivo para a existência de minha família... E as contradições que fizeram com que todos os moradores deploráveis repensassem suas próprias histórias e deixassem de se preocupar com o legado que unicamente nos diz respeito.
Nunca fomos ameaçadores. Apesar de todo o resto que nos condenou a esta causa perdida, jamais fomos motivo de antipatia àqueles que não se intimidavam com nossa aparência. Sempre comandados por dois pares de olhos – o da razão, que nos compelia a trancafiar o segredo que revelava o que realmente éramos; e o do coração, que nos lembrava dos motivos opostos à justa causa, nos guiando aos princípios de amor, união e proteção entre os familiares e amigos mais íntimos. Obviamente, nenhum deles partilhou de nossa real confidência, para que não corrêssemos o risco de sermos descobertos, e para não colocá-los no mesmo risco do qual estávamos envolvidos. Era um fardo que não deveria ser passado adiante.
Naturalmente, a obsessão em não nos revelarmos e não confiarmos nem mesmo em nossas sombras tinha um motivo mais válido, o que me traz de volta à minha súbita empolgação.
Um verdadeiro conto de terror imortalizado no coração dos Worden, guardiões do segredo da batalha. Pode-se dizer que somos os únicos que sobreviveram para continuar narrando esse episódio épico de Durhan. Curiosamente, o único lugar que guarda os escombros do conflito surreal – do quais os relatos de Timothy ainda permanecem sob a placa de madeira oca – localiza-se exatamente abaixo deste sótão. Na escada circular a oeste, onde tempos chuvosos proporcionam a ocasião perfeita para uma visita no vasto bosque aos fundos da pequena casa, antiga morada de outra família tão poderosa e magnificente quanto à que pertenço. Habitantes cuja longa existência deve-se às nossas palavras cuidadosamente bifurcadas atrás dos dentes.
A família cujo segredo nos pertence.
Uma família de vampiros protegida pelos guardiões.
Então surge a ironia. Quão tolo um garoto pode ser em momentos raros de insanidade. Apenas uma palavra solta e todo o resto estarão perdidos para sempre. A madrugada estendeu-se por tempo demais, e com isso minhas reações atingiram o auge proibido. Limite restrito. Barreiras lacradas.
Um segredo, afinal de contas. Que não deve ser pronunciado sem permissão.
A não ser que você seja um bebedor de sangue cuja própria vida não merece ser anunciada aos quatro ventos.
Sou o último guardião dos Worden. Ainda me resta uma última missão a ser cumprida. Aqui fica mais um relato incompleto sobre uma causa perdida que nunca teve um fim.
Que, pelo contrário, está prestes a começar."



E aqui também termina o relato de um de meus personagens preferidos. Mais algumas horas indispensáveis de sono e voltarei ao empório, talvez para visitar a biblioteca.
P.S.:Quem diria, além do The Verve eu escutei Coldplay. Coisa rara em minhas trilhas... Ao que parece, eles ajudaram.




Boa noite! (:


sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Tea Party. Do ya wanna come?

"As grandes coisas não são feitas por impulso, mas através de uma série de pequenas coisas acumuladas."

Grande preguiça nesta sexta-feira. Para não passar em branco, decidi resgatar um antigo post, escrito há algumas noites atrás, sem nenhuma graça. O que talvez explique a fuga da própria graça para o país de minha crônica. Dedicado agora para alguns amigos de rostos tristes que passaram por mim hoje. Vou me lembrar de convidá-los a um passeio para este lugar, meninos.

"Foi assim que acabei redescobrindo uma criança adormecida dentro de mim. Aquela criança que passou a maior parte dos últimos dezoito anos dormindo no sótão acima do meu quarto, imobilizada em um sono profundo que parecia durar uma eternidade em apenas um segundo.
Um ato impulsivo de curiosidade compulsiva. Foi desse modo que criei coragem para subir os degraus e abrir a porta, andar devagarinho na direção da menina de olhos fechados na perumba. Eu quase não estive ali nos últimos anos. Mais por medo do que por falta de interesse. Há algo mágico naqueles degraus que sempre me intimidou.
Fuçar o território do chão empoeirado na procura desesperada por alguma lembrança soterrada enquanto ela permanecia em um mundo mágico revelado por detrás das pálpebras. Seu ronronar era reconfortante, acolhedor... tarnsmitia coragem. Continuei minha busca pelos cantos, em silêncio gritante. O coração pulava descompassado, como se soubesse de minha traquinagem e discordasse dela.
Onde estariam as memórias? Onde estariam os recheios vividos que preencheriam as lacunas em branco? As historinhas das quais eu recordava dos velhos tempos em que podia brincar sem culpa, cair do balanço, pular na cama da mãe e do pai em meio aos risos... será que a menina os havia escondido de mim, como uma criancinha perversa? Seria muito errado despertá-la agora?
Uma resposta pairava acima de todas as perguntas não verbalizadas no escuro. A menina não precisava ser despertada. Ela começava a acordar lentamente em algum lugar dentro de mim, os olhos preguiçosos, de tanto adormecerem, apalpando a superfície gelada de meu peito, procurando algum sinal que a tragasse de volta para o Mundo das Maravilhas.
Um mundo sem dor.
Eu a havia cutucado sem querer durante a busca, tropeçando em um chapéu enxovalhado que residia no chão, de boca para cima. Grande, misterioso... convidativo. O ronronar cessara. Meus passos levaram minhas mãos ao objeto de estranha luz no fundo; as profundezas do chapéu pareciam intermináveis. Eu tinha medo de baixar a cabeça e cair no mesmo mundo onde morava a menina que eu despertara por acaso. Eu não queria ter de cair lá dentro. Eu não gostaria de sonhar... para quê?
O chapéu guardava minhas lembranças em seu fundo sem fim.
Era um convite irrecusável. Uma tentativa de me resgatar do meu próprio mundo sem graça e tão comum, uma chance para desbravar minhas próprias experiências do passado. Um túnel do tempo em um chapéu maluco. E se eu não pudesse voltar? E se eu estivesse condenada a permanecer naquela terra para sempre, cercada de criaturas incomuns e encantadoras que me fariam lembrar o que eu tinha esquecido? Eu estava com medo? Onde estava meu senso de aventura?
A falta de espírito me fez sentir raiva. Eu não era daquelas que arriscavam o que pudessem sem se dar ao trabalho de pensar em um motivo que fosse idiota o bastante para ser justificável. Sempre contando os minutos e segundos, em um ritmo constante de tempo. Tic-tac, tic-tac, tic-tac... Sem graça como as coisas sem graça desse mundo. Eu agora queria algo com graça. Algo para poder contar, relembrar e guardar, sem nunca se deixar perder. Sem mais tic-tacs.
Minha cabeça curvava-se para a passagem. Esquecendo da traquinagem e do barulho agudo de meu coração agitado, ajoelhei-me no chão e vi a mim mesma no reflexo de uma lembrança. Opaca, mas única. Meus tempos de criança. Os olhos sorriram, marotos, convidando-me outra vez.
Os olhos da menina que esperava, ansiosa, para me levar consigo ao seu lar. Para me apresentar ao dono do chapéu velho que guardava protetoramente minhas recordações mais preciosas de um tempo que na verdade nunca fora esquecido, mas que ficara adormecido por tempo demais.
Exatamente como a menina que estendia a mão para mim, esperando, com seus olhos sonhadores.
Meus olhos. "

P.S.: Texto inspirado em Alice in Wonderland, meu conto favorito de todos os tempos. Dedicado àqueles que ainda estão à procura de suas lembranças mais felizes. Elas podem estar nos lugares mais improváveis... como um sótão, por exemplo.
Um abraço especial às velhas amigas do sul. Daff, Lu e Dani, suas marotices em uma madrugada de sábado me fizeram sentir como se eu estivesse aí com vocês. Como uma Festa do Chá. Saudades.
Agradecimento rápido à minha trilha. Sara Bareilles e, óbvio, aos vídeos de Alice que deixaram a noite um pouco mais feliz...





Até a vista! (:

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

A milhas e milhas...

"Venta...
Ali se vê aonde o arvoredo inventa um ballet
Enquanto invento aqui pra mim um silêncio sem fim
Deixando a rima assim...
Sem mágoas, sem nada
Só uma janela em cruz
E uma paisagem tão comum...
Telhados de Paris em casas velhas, mudas
Em blocos que um engano fez aqui
Mas tem no outono uma luz...
Que acaricia essa dureza cor de giz
Que me estranha, mas não sabe se é feliz
E não entende quando eu grito!
Eu tenho olhos doidos...
São doidos por ti.
O tempo se foi... há tempos que eu já desisti
Dos planos daquele assalto
De versos retos, corretos
E o resto da paixão, reguei
Vai servir pra nós...
E o doce da loucura é teu, é meu
Pra usar a sós..."


Telhados de Paris - Nenhum de Nós


P.S.: Voltei para as antigas hoje de manhã... um obrigado especial à trilha da minha juventude.
(:

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Um Pouco Disso

"Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto." Fernando Pessoa

































♥'

Feche os olhos. Faça um pedido... ou muitos.


Descobri um blog bem legal hoje pela manhã. Um blog que descrevia todas as vontades, desde as mais absurdas até as mais coerentes. Me libertou um pouco da mesma sensação de todas as manhãs sozinha em minha casa. Bom, quase sozinha, dando pela presença de duas criaturinhas mais novas com o mesmo sangue que passeia por minhas veias e artérias. Pequenos irmãos chatos.
Decidi "roubar" algumas frases e colocá-las aqui, antes de seguir narrando meu bebê. Bom proveito para aqueles que esbarrarem neste post. (=

"Eu queria...
Resgatar algumas sensações adolescentes;
Voltar a escrever coisas que eu sinto de verdade;
Experimentar momentos de calma;
Adquirir hábitos exóticos;
Andar de papel e caneta;
Visitar uma perfumaria;
Poder dar umas mexidas no meu mapa astral;
Ficar aqui escondida por uns dias;
Um trailer pra viajar por aí;
Inspirar uma música de amor;
Envelhecer com dignidade;
Ter coragem de ir sozinha para meu sítio;
Uma Festa do Chá com o Chapeleiro Maluco;
Que o fecho da correntinha nunca andasse;
Que as rosas vermelhas caíssem em desuso;
Ser mais contemplativa;
Que não chovesse tão forte assim quando tô sozinha em casa;
Que conversas difíceis pelo menos acontecessem no sol;
Ser altamente desapegada;
Ser jardineira;
Uma vida bem pacata!
Sempre fazer falta;
Deixar de ver as partes chatas;
Transmitir tranquilidade;
Me motivar com aspas;
Viver de brisa;
Novos horizontes para 2010..."

Nada tão exigente assim.
Há alguns meses atrás, me diverti escrevendo capítulos de meus personagens. Uma espécie de apresentação para cada um, seus prós e contras, seus medos, seus sentimentos. Toda vez que leio é como se eu soubesse que eles realmente existem, ou que são pessoas melhores do que muitos de carne e osso que existem por aí. Pequenas partes de mim resgatadas em seus gestos.
Eu queria... que eles existissem de verdade.

1º Parte - Bernard, meu galã feito sob medida.

Meus olhos soterrados pelo cansaço de repente se abriram para a claridade repentina do quarto. Eu não havia percebido que caíra no sono. Geralmente eu demorava a adormecer, e quando o fazia, sentia-me estranhamente trôpego.
Mas a luz que vinha da pequena janela do quarto abarrotado era fraca o bastante para me fazer perceber que horas do dia eram. Porque todos os dias eu despertava mais ou menos no mesmo horário, entre cinco e meia e seis da manhã. Ainda não conseguira uma explicação relatando meus turnos excessivos sobre livros e livros antes de nem sequer precisar fechar os olhos para estar realmente dormindo, e ainda por cima conseguir acordar na manhã seguinte sem precisar do aviso estridente de um despertador. Era algo que eu fazia constantemente; acender o abajur empoeirado ao lado da cama de dossel durante o fim de noite e viajar histórias adentro, não importando quais universos mostrassem a direção.
Essa era a única forma que eu encontrava para escapar da estranha realidade que me cercava. O que era um consolo, vindo de alguém tão estranho quanto os dias incontavelmente nublados daquela pequena cidade.
Minha visão sobre o lugar em que eu vivia era sempre a mesma. Em Franklin, eu julgava os acontecimentos, locais e pessoas – tão parecidas no modo de se comportar, vestir e falar, como se fossem uma paste austera de um todo sombrio. Mais ou menos como uma dança caótica e deprimente sincronizada na mesma ordem tediosa com o passar dos anos. Uma expectativa invertida. A cidadezinha da qual eu morava a mais tempo do que pensei ser possível conservava o aspecto melancólico e britânico, cujo eixo era tão previsível que se podia aprender a voar por sobre os penhascos ao final da rodovia e isso não faria a menor diferença para os demais moradores.
Não era um lugar do qual eu gostava de viver, com seus riachos pálidos e florestas escuras e misteriosas – parecendo invocar espíritos bizarros no silêncio que se estendia pelos bairros –, as clássicas construções vitorianas predominantes em cada maçaneta preservada na calamidade. Todos os habitantes eram iguais para mim, indignos de tal conhecimento e mutualismo em relações não conservadas.
Uma terra viva e cinza que parecia mortificada, ainda assim interessante de se observar. Mas meu único e solitário pretexto – não podia chamá-lo de ambição, não quando eu detestava qualquer atitude atroz para se conseguir esse prestígio que eu não me importava se faltasse – era continuar a ser o esquisito que eu sempre fora. Apaixonado por livros, minha fuga do presente perturbador que me acompanhava como uma sombra por todos os cantos possíveis e inimagináveis. Eu não gostava muito de meus defeitos e nem ao menos reconhecia minhas qualidades, mas detestava muito mais os outros, com seus olhares de ampola vidrada cercando cada movimento de um desconhecido, como uma barata intrusa ou um bobo-da-corte que não era bem vindo em qualquer local.
E eu estava residindo ali somente há um mês.
Dispensei as cobertas que me cobriam com um espreguiçar dolorido. O livro que eu estivera lendo de madrugada caiu de meu colo com um baque surdo no linóleo. Abaixei e cabeça para me lembrar da capa, e reconheci a história que me fora presenteada por um primo rico e escritor. Pierre Nollan costumava compartilhar dos mesmos assuntos que eu quando estávamos no colegial. Mas após sua tentativa frustrada de publicar romances de um jardim de tulipas murchas por sua própria autoria, meu parente decidira se aventurar pela Europa com o dinheiro reservado para sua faculdade.
Seus riscos valeram à pena no final. Graças ao seu grande gênio e combustível para criar novos jardins em narrações mais empolgantes de se ler, com a discreta ajuda de uma autora conhecida no ramo que mais tarde se tornaria sua esposa, Pierre conquistou seu lugar em minha lista de obras favoritas.
O azarado que agora freqüentava a faculdade era eu, obviamente.
Depois de trocar o moletom velho que eu chamava de pijama por meus trajes pretos e confortáveis, cruzei o corredor vazio cor de caramelo, a não ser apenas por uma mesinha com mais alguns livros empilhados ao lado de um vaso sem flores na cruza com a cozinha. Esse era outro aposento abarrotado, não por restos de pratos sujos, pois eu pouco produzia algum alimento por conta própria. Quase todo meu consumo vinha de enlatados e lasanhas prontas. Mas minha cozinha também não se encaixava no padrão normal de uma casa normal, não se significasse comum ter pinturas na parede leste, demonstrando desenhos nem bonitos nem feios, mas que expressavam muito bem meu outro vício. O próprio desenho. Além das janelas forradas de metal preto com a sombra de uma abóbora projetada no vitral, parecendo sempre tremeluzir à ausência de sol, a mobília era fora do comum para qualquer um que tivesse sorte ou azar de entrar naquela casa e deparar com várias pinturas projetadas por cada canto. E como raramente alguém me visitava, eu tampouco me preocupava com a decoração.
Ignorei os fantasminhas que acercavam uma mesa bamba de chá na minha parede e parti para a única refeição da manhã: o café preto e puro, sem açúcar. Geralmente eu incluía umas jujubas às pressas na hora de sair, mas hoje eu não estava com a menor pressa, então a bebida quente desceria solitária por minha garganta. Não me sentei como de costume dessa vez; por acaso eu ainda me sentia estranhamente focado naquele minuto. Coisa que era anormalmente feita nas segundas-feiras.
Após escovar os dentes e tentar inutilmente ajeitar os cabelos – que no último mês cresceram desajeitados ultrapassando o limite do queixo – puxei a alça da mochila do encosto da cadeira e olhei mais uma vez para a bagunça de meu quarto. Reconheci papéis amassados contendo rabiscos de desenhos que decorariam o corredor, passando os olhos por um tênis vermelho embaixo do console da escrivaninha, detendo-se em um único livro esquecido no vão embaixo da cama. Seu marcador era visível apenas por uns dedinhos, o suficiente para que eu voltasse a ele e o erguesse em minhas mãos.
Hamlet era o único livro que eu deixara de ler para começar no outro dia a fase de interpretação. As falas e emoções dos personagens deixaram de fazer sentido para mim, além de me prenderem completamente naquelas páginas velhas. Então eu recomeçava uma nova linha a cada manhã, preparando-me para manter o esforço de entender aquela loucura de teatro em livro.
Eu ainda não desistira completamente.
Olhei em dúvida para o objeto preto em minhas mãos; o marcador estava quase no fim. Enfiei-o na abertura da mochila e saí correndo, não antes de surrupiar algumas jujubas do pote decorado com abóboras ao lado da cafeteira. [...]

2º Parte - Diálogo.

– Para onde você pretende ir? – perguntou ele com sua voz rouca e meio preguiçosa naquele início de manhã.
– Para onde mais eu iria? – perguntei com certo sarcasmo; era complicado evitar a hostilidade no hábito do cansaço.
Ele riu.
– Quer saber? Por que você não pede um atestado ou coisa assim para se ver livre daquele lugar ao menos uma vez? Você está tão branca quanto as páginas velhas que tem de ler diariamente...
Foi a minha vez de rir. Não era um riso animado.
– Entenda uma coisa. Eu preciso da biblioteca e ela precisa de mim – atravessei a rua tentando combater o estupor do cansaço com palavras pouco válidas. – Fim da história.
– Ótimo. Volte para seu conto de fadas e me deixe sozinho em meu empório – disse ele, barrando facilmente meu caminho apressado com apenas três passadas à frente. Seus braços cruzaram-se diante do casaco.
Encarei aqueles profundos olhos escuros. Sebastien Leighton Knepper transmitia a sensação de que eu estava esquecendo de algo crucial, algo que particularmente o envolvia em minha rotina. E ele estava absolutamente certo; meu melhor e único amigo utilizava dessas poucas desculpas para me trazer de volta à realidade, desculpas essas que culpavam minha falta de atenção. Ultimamente, estávamos mais para um casal de velhos: desgastados.
– Você nunca diz que precisa do teatro e vice-versa – disse ele, sua expressão no rosto fino e pálido demonstrava a decepção nada convincente. Os cachos estavam protegidos do frio sob sua touca vermelha.
– Uma coisa é diferente da outra – rapidamente lembrei-o de meu argumento original. Esse também estava ficando desgastado, tanto que fazia com que Sebastien revirasse os olhos de descrença.
– Porque você precisa desse estágio para continuar na cidade e os ensaios são a parte que te salva da loucura – recitou ele, voltando os olhos para meu rosto.
Exatamente. Aquela era a parte conturbada de meu eu mais volúvel. O lado irresponsável de atriz. Bom, julgando por tudo que eu estava passando no momento presente, a fuga do palco era perfeitamente acolhedora. Fazia com que eu me sentisse verdadeiramente em casa, um cantinho feito sob medida só para mim.
Mas nem sempre as coisas saíam desse modo.
Começamos a andar novamente. O frio parecia mais cruel depois do ultimato.
– Você vai continuar com essa história de que eu nunca faço nada por inteiro? – discuti meio na defensiva. Eu tinha culpa no cartório, mas não queria impor uma briga. Mais outra. – Eu estou me esforçando, Seb. De verdade. Mas não sou uma máquina...
– Não, você é uma bibliotecária – interrompeu ele, calmo na superfície. Eu convivia com suas emoções há muito tempo para reconhecê-las. – Que, por acaso, resolveu se aventurar no palco como uma atriz para escapar do tormento.
– Os livros nunca foram um tormento – protestei, fechando a cara.
– Eu fui?
Parei abruptamente, meus pés se recusando a prosseguir.
– O que diabos você está dizendo? – comecei a piscar para os chuviscos no caminho do metrô.
Sebastien encarou meus olhos confusos.
– Fui eu quem sempre te estimulou, Lauren. Caso você não se lembre, nós nos conhecemos no palco.
É claro que eu me lembrava. O tempo não apagara a lembrança daquele fim de tarde em um dos ensaios na Companhia de Theatro Franklin. Eu o vi no centro do palco, recitando a fala de um plebeu. Foi o único momento em que pude ter a certeza de vê-lo livre. Depois que nos conhecemos, pensei ter notado uma sombra permanente de amargura em seu olhar, e atribuí isso a mim mesma. Mas Sebastien nunca me deixava levar a culpa por meus atos.
Para isso serviam os amigos, afinal de contas... Quanto consolo.
Eu não entendia onde ele queria chegar.
– Nós levamos uma vida suburbana de adolescentes conturbados desde que você topou fazer parte do elenco – continuou ele, percebendo que eu ficara muda. – E eu adoro isso. Adoro te ver meio sonâmbula pela manhã, resmungando. Adoro poder ser o ator que te salva durante uma ou duas horas daquele lugar que te satura.
Eu permanecia muda. Os chuviscos se transformavam em chuva forte e nem ao menos percebi que havíamos chegado ao metrô.
Sebastien me olhava com melancolia.
– Eu gosto de te ver no palco, Lau – murmurou ele ao meu lado, vagando os olhos pelos trilhos. – É melhor do que conviver com essa Lauren cansada o tempo todo, sem tempo para nada. Por isso acho que eu sou o responsável... Você não estaria assim se eu não tivesse te manipulado. Se é que você me entende.
– Não comece com isso – reclamei com a voz fraca. Era duro ouvir a verdade. – Fui eu que escolhi levar duas vidas. O problema do meu cérebro não tem nada a ver com você. Eu... acho que estaria pior se você não estivesse comigo.
A situação era tão comum que eu não ficava mais envergonhada e constrangida diante dele. Nós não éramos a qualificação banal de amigos, por assim dizer; eu o considerava muito mais, quase como um irmão. E detestava chateá-lo com minhas desculpas idiotas sobre a falta de tempo.
O palco era nosso recanto... E eu o estava destruindo com minha ausência.
Seria preciso mais do que isso para convencê-lo. Arrastei-o comigo para os últimos bancos do vagão, sentando de lado para olhar seu rosto. Sebastien era um daqueles garotos indies que não se preocupavam em demonstrar as falas fora de hora. Encantador e imprevisível. Disperso... Ele me protegia mais do que eu merecia. Eu devia mais a ele do que ousava imaginar.
– Agora me escute – comecei por minha vez. O sono escapava diante do cenário que começava a se desenvolver naquela conversa. – Você nunca foi um tormento para mim. Foi justamente o contrário. Não houve manipulação alguma, nunca teve. Fui eu. Sou eu, que nunca tem tempo de sobra para um amigo. O tempo correu, Seb. Nós não somos mais adolescentes e não temos mais horas disponíveis como antes. Estamos seguindo um roteiro diferente...
Seu olhar se contraiu.
– Espere – alertei, erguendo um dedo na altura de seu nariz. – Não significa que eu vou abandonar tudo. Eu estou me esforçando mais do que nunca para juntar as duas partes do meu eu. Elas estão meio confusas agora.
– Por que você se esforça tanto? – sussurrou ele, me olhando atentamente. Aquele traço em seus olhos me incomodava. – Eu não quero isso.
Fechei meus olhos, respirando fundo.
– Muito bem. O que você quer, afinal? Além do que eu já estou disposta a cumprir?
– Quero você de volta. Aquela garota que eu conheci há um ano atrás e que não tinha medo de matar uma aula para subir no telhado... Que tinha mais tempo para ficar comigo.
Uma risada escapou de meus lábios antes que eu pudesse detê-la, encobrindo falsamente o golpe de dor que me atingiu.
– Você está parecendo um menino resmungão – toquei a ponta de seu nariz gelado, deitando a cabeça no banco.
Ele não riu de volta.
– E você não mudou nada – refletiu rouco. De repente, senti sua mão em meu cabelo e fechei os olhos outra vez. – Acho que devo me vestir de Chapeleiro Louco no próximo ensaio e gritar no mínimo umas dez vezes que você está terrivelmente atrasada.
Imaginei a cena enquanto ele acariciava a bagunça de meus fios. E, mesmo que fosse necessário, eu não o deixaria tentar. Eu faria melhor da próxima vez, sem muitos erros e poucos sonhos, dos quais me recusava a pensar enquanto estivesse acordada. Seriam esses que me atormentariam.
Despedimo-nos em cima da hora nas escadarias, atrasados como sempre. Sebastien beijou minha testa e correu para sua primeira aula de artes. Eu caminhava o mais rápido que minhas pernas de chumbo podiam agüentar. O cansaço começava a romper a tensão sem sua presença; eu estava perigosamente perto de desmaiar novamente. Ao invés disso, teria de me concentrar como sempre naquele outro palco.
O palco que me saturava.
Eu não me permitiria pensar em suas palavras. Pelo menos não agora. Estava tão acostumada com a rotina que não enxergava a nostalgia do recomeço. Todas aquelas estantes de livros grossos e distintos me recebiam, reconhecendo-me. Eu não estava pronta para desapontá-las. Duvidava estar pronta para qualquer outra coisa.
Ainda assim eu tentava.
A Sra. Waldo – loira e produzida demais para uma diretora bibliotecária – nem pareceu notar o meu atraso. Assim, a cumprimentei como em todas as manhãs e vesti meu avental vermelho, procurando me distanciar de suas falas egocêntricas e de seus olhares sugestivos. Lembrei-me de quando a conheci diretamente; acabei me decepcionando um pouco... Eu idealizava uma senhora bondosa com infinitas histórias para contar. É claro que ela tinha muitas. Mas eu não conhecia nenhuma e não me preocupava mais em saber.
Vi-me sentada no centro do piso de pedra na sala de estudos do segundo andar. Não era como sentar no telhado, mas transmitia mais ou menos à mesma sensação. Toda a parede sul era revestida de vidro, visando à beleza cinzenta de todo o gramado que cercava a universidade, mesclada com alguns pontos marrons e alaranjados pendidos nas raízes. Eu cumpria meu mantra seguidas vezes antes de a biblioteca começar a encher. Sentava-me ali, de pernas cruzadas e cabelos soltos, esperando ver algo mais do que a paisagem me oferecia, contentando-me desse modo com ela.
Seria sempre uma relação de duas faces. Gostar e não gostar, ser ou não ser...
Sacudi a cabeça para espantar o fantasma passado. Seria difícil me concentrar se minha mente resolvesse vagar para o lugar em que eu gostaria de estar no momento. Talvez eu precisasse de terapia. Ou quem sabe eu já estaria acostumada com a loucura? Nenhuma hipótese me consolava. Por fim, levantei-me trôpega e iniciei meu expediente na estante mais próxima. A sensação de dever; meus óculos pendiam no nariz, meu avental ficava empoeirado, meu cabelo começava a se soltar do coque. Era reconfortante.
A porta abria e fechava com o passar das horas. Nesse meio tempo – imaginando se Sebastien me encontraria no intervalo, pensando se demoraria muito – eu já havia organizado a maior parte das estantes. Procurava não pensar muito em meu estado após a “reforma”, não até encontrar um espelho. Calculei mentalmente o tempo que levaria até o banheiro dos fundos para me ajeitar e voltar como se não tivesse saído, descendo apressada as escadinhas circulares sem reparar na variedade de alunos que conversavam em voz baixa. Um comportamento massivo que me surpreendeu. Talvez ainda estivesse cedo...
O ranger da porta se pronunciou outra vez. Mais por hábito do que por vontade própria, relanceei os olhos para a entrada do aposento, reconhecendo a última pessoa que não esperava ver tão cedo. Por reflexo, estanquei no degrau, quase tropeçando no fim da linha ao tentar me recompor.
Todos esses movimentos não foram captados por aqueles brilhantes olhos azul-elétricos. Bernard se ocupava com a alça da mochila pendida no ombro, tirando o cachecol e passando a mão rapidamente pelos cabelos desarrumados. A porta se fechou sozinha, provocando outro ruído.
Então ele me viu.
Era estranho se sentir tão diferente quando eu estava em sua mira. Era, de certo modo, irracional que as coisas tivessem mudado a meu ver. Não me sentia como tais adolescentes que se equivocavam com aquele mistério todo, mas em parte a teoria fazia sentido. Eu tinha absoluta certeza de que não era a única a notar sua aparência de outro mundo. E me tachava de idiota por isso.
Despertei daquele transe incomum e continuei como se ele não estivesse ali. Não valeria a pena me aproximar muito e ser humilhada por sua beleza. Acenei brevemente e sem graça para uma das monitoras que me viu no estreito corredor – muito mais arrumada do que eu – e disparei para o banheiro. Minha respiração era urticante em minha garganta. Encarei meus traços assustados no espelho velho sobre a pia de mármore, desprezando minha imagem costumeira. Lavei o rosto e ajeitei o coque, depois o soltei de novo. A histeria me irritava.
O que diabos ele fora fazer ali, afinal? O fascínio de ontem cedia lugar ao terror de hoje, manipulando meu controle. Eu não justificava as atitudes antes dos gestos, porque não arriscaria outros minutos em sua presença. Eu não permitiria a mim mesma outro turno àquele conto de fadas maluco. Respirando fundo, prendi os cabelos em um rabo de cavalo frouxo, sacudi a poeira do avental e brinquei um pouco com a franja, afastando-a dos olhos subitamente brilhantes de euforia.
Encarei meu reflexo uma última vez antes de sair.
E mostrei a língua para ele.
– Ei, qual é o último lançamento? – perguntou-me uma voz enquanto eu subia atrapalhada de volta para a sala.
Me virei e dei de cara com Harlow Wadden Burton, uma das garotas do elenco.
– Oi – cumprimentei com um sorriso involuntário. Eu gostava dela, seu jeito de alguma forma simpático se diferenciava do meu, complementando-o ao mesmo tempo.
Seus olhos amendoados e castanhos sorriram para mim.
– E aí, bibliotecária? – os cabelos bastos estavam trançados por sobre o ombro. Seu estilo inteligente de garota das ruas me intimidara no começo. Agora eu poderia dizer que éramos... boas amigas.
Eu precisava me livrar do fardo do qual todos me chamavam por aquele nome. E tinha de parar com o distúrbio injusto de que todas as garotas que conhecia até então eram mais bonitas e confiantes do que eu.
– O de sempre – respondi à pergunta explícita, subindo as escadas na sua frente. – O que você estava dizendo? Ah, sim... acho que temos Macbeth em algum lugar por aqui.
Ela riu.
– Não precisa me agradar em seu cantinho, Lauren – ela encolheu os ombros. – Só passei aqui para confirmar sua ilustre presença no Theatro hoje.
Eu murchei por dentro.
– Você não deveria estar na aula? – esquivei-me por reflexo, ajeitando os óculos. Harlow era colega de classe de Sebastien. E tinha uma mente tão impulsiva quanto.
– Escapei para buscar um livro para o próximo período – desconversou ela, sorridente.
– Desde quando vocês lêem livros nas aulas de artes?
– Desde sempre – ela vagou os olhos pela estante lateral. – Você tem mesmo Macbeth?
Revirei os olhos, desistindo.
– Ele te mandou até aqui para me vigiar? – perguntei, franzindo os lábios. Sebastien não largava de mim nem quando estava longe. Isso me tirava do sério.
Harlow ergueu uma sobrancelha.
– Quê? – Ela balançou a cabeça com uma risada descontraída. – Você não é o centro do universo, garota. Deveria saber disso.
– Vou me lembrar da próxima vez – murmurei de cara amarrada.
Ela afagou meu ombro. Harlow era mais alta do que eu. E também sempre tivera mais desenvoltura no palco, como todos os outros atributos que me faltavam... Enruguei a testa e lutei para me livrar do senso ridículo de que eu tinha algum parentesco com um ET, e virei o rosto na direção das últimas mesas.
Lá estava ele. Quase tinha me esquecido de sua presença, o que naturalmente era impossível esquecer. Seus olhos rastrearam minha desenvoltura desengonçada e se detiveram nela; elétricos, lindos e intensos.
Fiquei paralisada.
Bernard baixou a cabeça, voltando a se concentrar no livro. Como se não tivesse me visto ali há meio segundo, ou como se eu não valesse o esforço. Bem, agora eu estava mais arrasada do que antes. Respirei uma golfada de ar e tentei voltar para meu corpo.
– Lau? – o riso na voz de Harlow desaparecera. Ela agora me cutucava insistentemente. – Ei, acorde. Você vem com a gente ou não?
Ergui os olhos para sua expressão confusa, temendo que ela tivesse presenciado meu estado deplorável de nervos.
– Desculpe – murmurei, retirando um livro qualquer da prateleira e pretendendo descer e me esconder no armário. – Encontro vocês no intervalo. Agora tenho de trabalhar.
– Tudo bem – respondeu ela, olhando meu rosto como se estivesse vendo algo que não gostaria de ver. Tampouco me preocupei em disfarçar.
– Ah – lembrei enquanto meu pé alcançava o primeiro degrau. Lutei tremendamente a fim de não olhar para trás e encontrá-lo emudecido no canto. – Macbeth está na terceira prateleira da primeira estante.
Harlow continuou me fitando.
A sensação de que algo errado fazia parte de mim nunca fora um problema antes. Eu sempre soube que meu cérebro não funcionava como o dos outros, recusando-se a pensar da mesma maneira que o resto do mundo. Eu sabia que era diferente de tantas outras garotas e me orgulhava disso.
Até agora.
Meu pai – o fantástico cineasta londrino Jason Curtis Worden, o único que era capaz de me entender – costumava dizer que eu não me encaixava no protótipo comum feminino. O que significava eu não ligar para maquiagem nem gostar de passatempos intragáveis. Eu era a garota de humor negro que gostava de uma bom guarda-roupa preto e que assistia uma maratona de filmes de terror em sua companhia depois do cachorro quente suculento do jantar.
Eu era incomum e gostava do incomum.
Seria mesmo tolice dizer que os tempos mudaram? A banalização de uma universidade e todos os seus conceitos restantes seriam suficientes para me mudar de uma hora para outra? Para separar minha família? Eu estaria mesmo largando tudo pelo qual me acostumara no passado, minhas raízes, como Sebastien dera a entender que eu fizesse? Se fosse isso – e a parte normal de meu cérebro assimilava essa teoria – eu não gostaria de me ver realmente. Eu não era o centro do universo e não precisava ser. Eu só precisava continuar sem o tormento de me sentir a excluída da sociedade. Muito menos tentar chamar a atenção de um veterano.
Isso requeria um esforço bárbaro. [...]


Paro por aqui com minhas confissões de terça. O tempo lá fora está nublado, do jeito que gosto, e estou pensando em preparar uma xícara de café fumegante ao invés de almoçar. Os velhos vícios de sempre...
P.S.:Agradecimento rápido à trilha de The Vampire Diaries, Plus 44 e Lily Allen. Ótimo pano de fundo para seguir escrevendo até as juntas dos dedos reclamarem do cansaço.


Boa tarde! (:

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Cabeçalhos e Rodapés


"As figuras imaginárias têm mais relevo e verdade que as reais." Fernando Pessoa

Hoje completei mais um turno nas livrarias. Duas delas, mais precisamente localizadas no centro da avenida. Eu realmente me perco dentro de mim mesma em um lugar com tantas histórias diversificadas que convidam o leitor a folhear as páginas à procura de uma narrativa que valha a pena ser desbravada. Sem dúvida, meu cantinho preferido em meio a tantas ruas que se estendem como cobras por quilômetros a fio no litoral.
Entre tantos outros pensamentos que correm soltos nesses breves momentos, percebi o quão difícil é encontrar o primeiro capítulo de um shoujo mais antigo que dirá meus 18 anos, assim como é ruim namorar uma caixa de pequenos cadernos contendo anotações da escritora cujas obras você acompanha desde que se conhece por gente, e não poder guardá-la na bolsa. Paciência, é o nome de minha angústia de segunda-feira. A única virtude que eu definitivamente não possuo. Um de meus muitos defeitos.
A segunda parada foi na "lojinha da bruxa"; muitas fadas suspensas no teto por barbantes, trilogia de Senhor dos Anéis, tarô, cheiro de incenso... outras definições de empório. Um breve passeio que me trouxe de volta ao ponto inicial. Mais uma dessas viagens no tempo.
A criação de minha própria obra.
Já faz algum tempo - começo de agosto de 2009, mais precisamente - comecei a ter sonhos estranhos. Não que eu não os tivesse antes, porém, nesse período de tempo eles se tornaram mais nítidos. E comecei a ficar ligeiramente apavorada com os cenários cada vez mais frequentes, e abismada com minha capacidade de por os sonhos em palavras que aos poucos foram se tornando epílogos, depois capítulos. Somado com o fato de que eu fabricava um livro no cérebro desde novembro do ano retrasado, minhas ambições me deram muito o que pensar. E muito mais o que fazer.
Os sonhos basicamente se alternavam entre outono e inverno. Uma estação amena e acolhedora emendando-se em um laço na outra que carregava o frio intenso e a neve nas costas. O palco onde elas se desenvolviam era uma pequena cidade britânica, ainda sem nome definido na época, mas que conservava as construções vitorianas e acinzentadas de séculos passados. Em resumo, um lugar clássico, perfeito encaixe para os personagens que também perambulavam por meus sonhos frequentes.
E aqui vai uma explicação. O bebê pergaminho se originou oficialmente em meados de 2008, em uma noite qualquer de uma semana qualquer em um curso de pré-vestibular. Não que eu não prestasse atenção nas aulas, mas nunca adaptei total concentração em explicações numéricas que, na época, não faziam muito sentido. Enfim, foi naquela sala que o rascunho se desenvolveu. Em minha carteira proporcionei a origem da trama, com poucas opções na época(minha mente não era muito dada a grandes aspirações). Ao menos eu tinha um arquivo de nomes sob a manga, ainda que limitado.
De início, um rapaz veterano de uma universidade local, sem curso definido, mas que a porpósito chamava-se Bernard (sem sobrenome; sim, haviam muitas falhas no contexto), um simples humano introspectivo e reservado em sua própria órbita, que acabou por conhecer a bibliotecária da dita universidade. Lauren (também sem um sobrenome), filha de pais separados, baixinha e esquálida. A princípio, não havia nada que me impulsionasse a ir adiante. Somente um veterano estonteante e uma garota magrela não pareciam um tema muito digno de ser explorado. Foi então que me veio a luz, no meio de uma aula intragável de matemática, onde eu sequer prestava atenção na voz arrastada do professor.
Tema tanto quanto clichê nos dias de hoje. Envolvente, encantador. Assustador.
Vampiros.
Sim! Agora certamente valeria a pena - e muito - explorar a história desse ângulo. Uma família de vampiros, sem nome, sem dons, mas que já me influenciaram a desistir da matemática e entrar de cabeça na cidadezinha do aparente casal. A partir daquela noite começava meu ciclo do sono. Muito sono e pouco tempo para dormir. Mas eu não me importava, concentrava-me em pesquisar todos os aspectos que valessem um cantinho em meu futuro livro. Nunca lera nada sobre vampiros e coisas do tipo, eu só assistia Buffy. E essa era uma parte muito fraca no todo.
Outra explicação: só eu sei o quanto meu estoque de inspiração era limitado. Drácula, Nosferatu, Anjos da Noite... não era um ponto fixo para se começar uma trama. Claro que, naturalmente, vieram as fontes que ajudaram no decorrer das ideias lunáticas, partindo do ponto de vista de um projeto de escritora com um projeto de livro em mãos. L. J. Smith, com seus diários de vampiro e toda aquela história de que tais seres místicos precisariam ser convidados a cruzar a soleira da porta (impossível não aludir ao termo. Fico devendo essa). E mais algumas revistas dadas de presente por amigos do 2º, minuciosamente contendo outros cenários que aumentaram a quota de ideias; tolhidas naquele tempo. Obrigado por partilharem de minhas loucuras, meninos.
Seguiu-se uma rotina. Estudo, livro, curso. Depois da viagem, mais trabalho e livro. Eu finalmente tinha um esboço do que futuramente seria o começo da saga; nomes para meu clã, tramas enlaçadas e algumas divertidas tragédias. Os dons e os demais aspectos cruciais para essa história só viriam depois, quando minhas aulas reiniciaram e eu pude obter mais tempo livre.
O trabalho propriamente dito começou após as férias de inverno. Meu casal já tinha nome, sobrenome, família e suas origens. A trama se passava em uma cidadezinha inglesa chamada Franklin. O cenário de repente se tornou muito mais fascinante. O veterano não tinha nada de especial até então, mas exercia um alto nível de persuasão sobre a pobre bibliotecária que, por sua vez, chegava a ser apaixonante para ser considerada normal. E assim os pontos iam se interligando - possíveis herdeiros de um trono mais antigo do que as roupas puídas de Merlin, dilemas envolvendo o mundo dos humanos na guerra civil e a família de vampiros antecedentes ao meu clã. Paixões proibidas, dons maléficos, olhos enigmáticos. O cerco se fechava do jeito que eu sempre queria que fosse, ainda com algumas falhas, mas quase que completamente formado. O ciclo do sono era uma coisinha mínima àquela altura...
Depois de escrever, reescrever e reescrever de novo, burilando tudo quanto foi descartável e incluindo tudo o que fosse importante, comecei a sonhar outra vez. Mas o outono tinha sumido. Uma camada de neve cobria tudo ao meu redor e eu via um futuro muito diferente do qual pensava que havia acabado. Um segundo livro. Essa ideia me fazia cócegas e meu pânico recomeçava. O que eu faria para não deixar a história caída, sem graça? Nisso eu ainda estou pensando, aos poucos, enquanto termino meu primeiro filhote recém-criado. Resultado de meses e meses de distúrbios. Minha mãe ainda diz que minha cabeça não pensa como a de todo mundo, o que, para mim, é um grande alívio. Mal consigo pensar em como seria ruim pensar como todo mundo e ser incapaz de seguir narrando o imaginário em camadas no relevo coberto de neve espessa.
Mais uma vez, devo minha gratidão à minha mais recente fonte de inspiração. Não sou o primeiro protótipo de escritora e não serei a última a louvar a banda Muse. Eu não saberia de onde tirar forças para seguir caminhando sobre as folhas na neve. Sei que devo muito à Matthew Bellamy, cuja voz estaria mesmo perdida se dependesse do quanto eu escutasse suas músicas inspiradoras. Obrigada, Muse, por partilhar de minha insanidade nos dias de calor insuportável, permitindo que eu criasse Autumn e Winter com um afinco que não esperava ser possível. Um agradecimento especial às minhas novas descobertas que também fazem parte de minha trilha; Copeland e Lostprophets.

P.S.: último agradecimento da noite à minha irmã de coração. Lindo comentário, Ann. Sem dúvida, tu és o S do meu 2. Obrigada por sua compreensão e pelos minutos intermináveis de conversa à distância em que minha boca tagarela mais do que a sua capacidade de soltar palavras.


Abraços! (:




Reapresentação


Notou a diferença?

Sempre gosto de mudanças. Em um período ou outro de tempo qualquer, invento de dar essas repaginadas espontâneas. E o resultado muda de foco... nem sempre pra melhor, pois as mudanças significativas são as que realmente importam. Pode-se dizer que esta é uma nova mudança, um recomeço. O pequeno relicário na outra face do blog, em meio ao caos de todo dia. Aqui eu fico por tempo interminável, reabastecendo as sensações que me são proveitosas; nada daquelas que empacam as ideias feito burritos de carroças velhas. Aquelas que me fazem viajar nos tempos antigos (e quase sempre piegas), mas onde a felicidade fica mais concentrada. Com um pouco de drama, naturalmente.
Um equilíbrio delicado de tristeza, humor e horror.
Lhes apresento... meu bebê pergaminho.

"As pessoas só observam as cores do dia no começo e no fim, mas, para mim, está muito claro que o dia se funde através de uma multidão de matizes e entonações, a cada momento que passa.
Uma só hora pode consistir em milhares de cores diferentes.
Amarelos céreos, azuis borrifados de nuvens. Escuridões enevoadas.
No meu ramo de atividade, faço questão de notá-los.
Já que aludi a ele, o único dom que me salva é a distração. Ela preserva minha sanidade. Ajuda-me a agüentar, considerando-se há quanto tempo venho executando este trabalho. O problema é: quem poderia me substituir? Quem tomaria meu lugar, enquanto eu tiro uma folga em seus destinos-padrão de férias, no estilo resort, seja ele tropical, seja da variedade estação de inverno? A resposta, é claro, é ninguém, o que me instigou a tomar uma decisão consciente e deliberada — fazer da distração minhas férias. Nem preciso dizer que tiro férias à prestação. Em cores.
Mesmo assim, é possível que você pergunte: por que é mesmo que ela precisa de férias? De que precisa se distrair?
O que me traz à minha colocação seguinte.
São os humanos que sobram.
Os sobreviventes.
É para eles que não suporto olhar, embora ainda falhe em muitas ocasiões. Procuro deliberadamente as cores para tirá-los da cabeça, mas, vez por outra, sou testemunha dos que ficam para trás, desintegrando-se no quebra-cabeça do reconhecimento, do desespero e da surpresa. Eles têm corações vazados. Têm pulmões esgotados.
O que por sua vez, me traz ao assunto de que lhe estou falando esta noite, ou esta manhã, ou seja lá quais forem a hora e a cor..."

Markus Zusak - A menina que roubava livros.


Tem vezes que a pergunta faz uma visita em meu subconsciente: de onde vêm as histórias? Elas já são fabricadas prontas, entregues aos seus leitores pelo correio-coruja, embaladas em papel pardo? Produzidas por alguma cabeça altamente provida dos mais diversos tipos de universos parelelos em cenários que se modificam? Seria um tanto impossível, alucinatório. Então me ocorreu outra resposta mais plausível. Em sua maioria, as grandes histórias surgem nos momentos de inlucidez, na hora mais improvável do lugar mais impróprio para se estar. São as grandes histórias que surgem do nada que levam maior tempo para serem inventadas. São cenários inventivos, sonhadores, tragando o mau humor para onde ele não pode ser despertado. Drenando a esperança para o antro das páginas escritas. Inicia-se a viagem sem fim com aqueles passageiros que preferem mil vezes embarcarem no mundo avesso do que continuarem esperando sentados as próprias histórias se desenvolverem.
A cabeça de um escritor (por mais controverso que ele seja) é tomada de hipóteses. Decisões que se modificam, passos que retornam, profecias que se cumprem. Não imagino como funciona o cérebro de muitos, mas o meu literalmente embarca nessa viagem; ele não compra a passagem de volta. É uma transição somente de ida para os lugares unicamente criados sob seu proveito. E isso depende da atual gama de emoções, sentimentos e estado de espírito. Gosto especialmente do tempo nublado; serve como maior inspiração nas horas cujo meu propósito e seguir a linhagem do conto. Nessas horas não sinto a participação dos ponteiros do relógio. Entrego-me ao ruído sereno da chuva e deixo a imaginação tomar a frente das suposições, ao invés de ser comandada pela parte racional. É um trabalho exclusivamente relaxante, além de estressante, preocupante e simplório. Cura as doenças da mente como outro remédio jamais seria capaz de fazê-lo. Escrever não deixa um gosto ruim no céu da boca.
Muito pelo contrário... deixa a gente com um gostinho de quero mais.
É nesse espaço que recomeçarei do zero. O pontapé inicial de meu próprio conto de maravilhas. Sim, as inspirações vêm de alguns poucos lados. Antes de mais nada, um pós-script de agradecimento às fontes sagradas de inspirações.
Ao meu conto infantil favorito, Alice in Wonderland, que me fez descobrir a possibilidade da existência do impossível.
Ao mestre do terror encantado, Tim Burton, que me conquistou de alma e coração e que até hoje lidera as engrenagens de minhas linhas com sua imaginação mágica e viciosa de outro mundo.
Aos livros que percorreram comigo os passos da infância, adolescência e revigorada fase adulta, permitindo-me um limite irrestrito de tempo fantasioso: Desventuras em Série, Harry Potter, As Brumas de Avalon, O Ladrão de Raios e por aí vai...
Às minhas recentes trilhas sonoras que permitem horas a fio de pensamentos soltos que se complementam nas falas e ações de meus personagens: Paramore, Kings of Leon, Marjorie Fair, The Cure e, não menos importante, Muse.
E por último, à minha estação que está prestes a começar. A cede de minha velha nova história...
Outono.
Dadas as apresentações, interrompo as parafernalhas. Hora de embarcar. Aqui recomeço minha saga para aqueles que acreditam igualmente nas palavras que acabei de digitar com meus dedos incansáveis.
Sejam novamente bem-vindos ao meu empório.